terça-feira, 3 de agosto de 2010

1976 - TI JOÃO E TI MARIA VELHA

os verdadeiros senhores da Berlenga João Rodrigues Pereira (Ti João) e Maria Elisa Soares
Anastécio (vulgo Maria Velha), ele de 64 anos de idade, ela de 60, formam aquele simpático casal que, de há longa data, em cada ano permanece na Berlenga 8 meses, incumbido das mais variadas tarefas.
São eles que zelam pela limpeza duma parte desta maravilho
sa ilha, em particular, a zona do Carreiro do Mosteiro, que vigiam e põem em funcionamento os geradores de corrente, que acolhem em sua modesta casinha com a mais cativante  hospitalidade qual quer pescador em apuros, dando -lhe, quantas vezes, de sua comida e dispensando-lhe até a sua cama. E sempre que foi caso disso, o ti João também sabe prestar primeiros socorros.
A casa é modesta. dissemos, (neta foram todavia crescendo na sua companhia, sabe Deus como, os seus quatro 1i1hos, hoje casa dos) mas, desde há pouco tempo, o Proprietário (a Exma Camara) lá a dotou com uma casa de banho e mais um quarto.
Com a maior regularidade dura o cumprimento desta missão há 23 anos ao serviço do município local.
O Ti João vê com muita apreensão o seu dia de amanhã pois, sendo considerado apenas trabalhador eventual, não só está privado de beneficiar de qualquer
espécie de assistência gratuita como sente já angustiadamente
pesar no seu espírito a ameaça duma velhice sem reforma.
— Será este o prémio da grande dedicação que tem por aqueIa ilha, onde é de tanta importância a sua presença?
— Quem tão longamente vive ria assim mergulhado na solidão, uma solidão que só na época estival é quebrada pela companhia dos turistas?
Há, no entanto, muita gente para quem a vida deste casal não é  indiferente e bem significativo testemunho disso foi aquele jantar de homenagem com que no
Verão passado, no dia 7 de Agosto o Grupo de Amigos da Berlenga o brindou.
E vem até a propósito dizer que, apesar das limitadas possibilidade de deslocação para
aquela ilha, e do problema de espaço para reunir numa sala muita gente, ainda assim o ti João
e a ti Maria Velha viram-se na quele dia, no Pavilhão Mar e Sol, envolvidos pelo calor humano de 119 bons amigos que muito os estimam.
Discursos, canções, projecção de diapositivos, ofertas de recordações animaram o acontecimento onde, em vez de rotineiro protocolo, quem verdadeiramente
pontificou, em tudo o que se passou naquela inesquecível noite, foi o coração.
— Será que a Justiça vai ser madrasta para o Ti João e Ti Maria Velha?

Publicado em "A Voz do Mar" em 1976

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